Wednesday, February 9, 2011

Se a economia e o emprego se expandem, por que a criminalidade não diminui?

Desde os tempos do ensino fundamental, ouvi e aceitei como explicação para a violência endêmica em nosso país que nossa gigantesca desigualdade social era a causa dos altos índices de criminalidade. Por conseguinte, o criminoso não é culpado, mas vítima de uma sociedade injusta.
Nos últimos oito anos, todavia, a renda média do brasileiro aumentou consideravelmente e, com a expansão generalizada do consumo, aquilo que um dia pareceu uma barreira intransponível entre classes sociais hoje se mostra como um fosso em vias de ser preenchido. Diante desses fatos, uma pergunta óbvia se impõe: se a violência é causada pela miséria e pela desigualdade social, a queda destas não deveria ser acompanhada - de maneira diretamente proporcional - pela queda dos índices de violência e crimes contra o patrimônio? Contudo, basta um olhar de relance para as estatísticas atinentes a essas ocorrências para constatar que a criminalidade (em suas modalidades mais corriqueiras: crimes contra a vida e crimes violentos contra o patrimônio) não vem diminuindo, mas meramente oscilando dentro de uma margem de erro. E - mais grave - nos anos em que o número de homicídios caiu, verificou-se um aumento no número de tentativas, o que nos leva à conclusão de que esses crimes não diminuíram, mas sim a mira de seus potenciais autores...
O resultado dessa reflexão é que a explicação tradicionalmente aceita para a violência deve ser, no mínimo, revista, sendo este problema repensado à luz de outros fatores, como a estrutura cambiante dos núcleos familiares e o conteúdo insuficiente e falho de nosso ensino básico.

5 comments:

  1. A injustiça social é estruturante da criminalidade, não determinante. Uma visão que vitimiza os "deliquentes" é quase lombrosiana. Ao passo que a pobreza é vítima, o fa(r)do de delinqüir é inescapável. E o sistema judicial, liberal ( ou o que tem restado do liberalismo) pautado na isonomia, imputa-lhe responsabilidade. Distorção ideológica com graves consequências... É a luta da ordem contra a natureza, em que se iguala essa com a pobreza. É impossível eliminar a natureza, porém é possível explora-la. Que a pobreza não justifica a criminalidade, isto é inquestionável e concordo com você, Fabião! Na verdade, justifica todo o resto!

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  2. Fantástica a ideia do blog, acompanharei!

    Não discordo totalmente do que você colocou, porém se a estatística de homicídios não for per capita acho que você tem que enfrentar uma distorção razoável aí pelo crescimento natural da população brasileira, que não é pouca (não é gigante e talvez seja irrelevante para os dados, mas enfim, vale pensar a respeito). Se essa presunção (de que na verdade, per capita, temos menos homicídios), na verdade a sociedade está menos violenta.

    Outro ponto que corrobora com a sua tese, mas não mata a tese inicial, de que há uma relação relevante entre pobreza e criminalidade é que o homicídio talvez seja o mais igualitário dos crimes, estando, de uma forma ou de outra em todas as classes sociais, e não sei bem como as estatísticas o tratam. Por exemplo, acidentes de carro com vítimas fatais salvo engano, são computados como homicídios e na verdade não decorrem de diferença de classe, pelo contrário, quanto mais pessoas com carros tivermos, a tendência é o número subir. Meu ponto, portanto, é que talvez homicídios não sejam a melhor regra para testar a tese ensinada no ensino médio.

    Algo que talvez corrobore com a tese de forma mais eficiente seja o volume operado pelo tráfico, por exemplo. Ainda sim é muito falho, dado que rola uma retroalimentação entre o quanto se tem de recursos para comprar drogas vs. o volume que o tráfico vende, mas de qualquer forma, em tese, quanto mais rica uma sociedade, pelo menos o tráfico deveria ter menos exércitos de pessoas dispostas a ameaçar a vida como ganha pão.

    Escrevi uma bíblia, mas enfim, na melhor das intenções!

    Abs!

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  3. Olá, meus caros, agradeço pela colaboração e pelas ideias. De fato, acho que há mais convergência do que divergência em nossos raciocínios; só devo ressaltar alguns pontos: 1) Mário, tenho refletido bastante sobre as mazelas da justiça "liberal" e uma conclusão provisória é que a isonomia é um grande ganho histórico e que não podemos chamar o sistema penal brasileiro propriamente de liberal, pois, se ele não fornece subsídios para a realização da igualdade, ele não o é, mas funciona de maneira distorcida. Isto não pode nos levar, claro, a uma rejeição completa, de maneira a estimular um boicote, mas a críticas mais refinadas e que abram novos horizontes. Vou discutir esse ponto em outra ocasião, mas digo de antemão que a aplicação correta de princípios liberais não produziria a distorção que hoje se verifica.
    2) Bruno, as estatísticas às quais faço alusão (deveria tê-las citado, claro) são de níveis de homicídio a cada cem mil habitantes, isto é, o crescimento da população não produz distorções sobre elas. 3) A escolha de homicídios e crimes violentos contra o patrimônio se deve ao fato de que a maioria esmagadora dos casos que batem às portas do judiciário são ocorrências desse tipo. E, efetivamente, pelo menos o homicídio é um crime democrático, o que corrobora a minha tese: não se pode atribuí-lo à pobreza, mas a algum tipo de anomia.
    4) A questão do tráfico, como vc colocou em evidência, é complexa pois envolve múltiplos fatores, como a existência da riqueza que o financia. Cabe lembrar, no entanto, que a maioria das populações carentes não toma parte nele, sendo afetada em outros aspectos pela sua condição desfavorecida. A conclusão é que, como hipótese causal, a miséria não é explicativa.

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  4. Oi, Fábio, amei a ideia do site!
    A criminologia crítica parte do pressuposto da seletividade da Justiça Penal, que se destinaria a determinados sujeitos estigmatizados pela sociedade, já que, em regra, não alcança pessoas mais abastadas. Esses "selecionados" estariam em um círculo vicioso, na medida em que, uma estigmatizados, tornam-se mais visados pelo Direito Penal e, uma vez que mais visados (e mais punidos), tornam-se mais estigmatizados.
    Essa visão pode ser muito determinista, mas penso que acrescenta algo a sua reflexão: o fato de haver um crescimento econômico do país não muda o modo como as pessoas (e os agentes do sistema penal, sobretudo os Juízes) vêem esses estigmatizados, que têm dificuldade em sair da teia onde se enfiaram (ou onde foram enfiados). A continuidade no crime pode ser a única opção por eles visualizada, ou mesmo propagada.
    E, sempre lembrando, que quanto mais desenvolvida a economia, maior o número de conflitos, e maior também o espírito consumista que impulsiona o desejo de aquisição de determinados bens, o que poderia impulsionar os crimes patrimoniais.
    Espero não ter escritos besteiras!
    Saudades!
    Ana

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  5. Há três tipos de mortes de causas evitáveis segundo a metodologia adotada por órgãos do governo brasileiro. Eles são: homicídio, suicídio e acidentes. Sendo assim, a linha de raciocínio de Bruno encontra-se equivocada, uma vez que o aumento de mortes por acidentes de carro, por exemplo, não aumenta a TME (taxa de mortalidade específica) por homicídio, pois são classificações distintas. Tal modo de pensar pode fazer sentido se, sob uma análise mais aprofundada, dermo-nos a incumbência de questionar a credibilidade do trabalho realizado pelo IML (Instituto Médico Legal), já que nesses tipos de morte é obrigatória, de acordo com o Código Civil, a realização de autópsia.

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