Monday, June 20, 2011

Sobre a descriminalização da maconha

Mais uma vez as "elites pensantes" de nosso país tornam solenemente as costas para a opinião de ampla maioria da população (segundo o datafolha, 74% dos brasileiros são contrários à descriminalização da maconha) e buscam impor - através do intenso controle que exercem sobre os meios de comunicação - uma pretensa solução para a galopante expansão do uso de drogas no Brasil (estatística na qual andamos na contramão da maioria dos países latinoamericanos, que reduzem anualmente o número de usuários): deixar de tratar o usuário (por enquanto, de maconha, notória porta de entrada para todos os tipos de drogas pesadas) como criminoso e transferir o problema da competência da polícia para a saúde pública. Paralelamente, afirma nossa inteliggentsia, reforçar-se-ia o combate ao tráfico, tanto por meio do policiamento de fronteiras como pela promulgação de normas jurídicas mais duras para punir os traficantes, no estilo da lei de crimes hediondos atualmente em vigor. Seria de bom alvitre levantar algumas dificuldades das quais padece este plano de ação, por nós sumariamente exposto: a primeira delas é de caráter sociológico e se resume ao fato evidente de que a descriminalização do uso resultaria instantaneamente num aumento do mesmo, dado que encorajaria os atuais consumidores a intensificarem o consumo ao mesmo tempo em que afastaria a inibição de expressiva parte da população que atualmente deixa de fazê-lo por simples fidelidade à lei (sim, meus amigos, isso ainda existe); um exemplo recente pode nos ajudar a compreender melhor a situação: consultado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo sobre a dispersão de uma "roda de fumo" numa praça pública por parte da autoridade policial, um conhecido magistrado de Campinas afirmou que a polícia não tem competência para fazê-lo, pois a atividade dos "fumantes" não ofende nenhum bem jurídico. Pensemos, portanto, no grau de salubridade de nosso espaço público caso um entendimento como esse venha a ser adotado, não é preciso muita imaginação para projetar a futura presença de mini-cracolândias em territórios bem maiores do que os atuais. A segunda dificuldade reside no evidente afogamento de nosso sistema público de saúde, que ainda se vê às voltas com doenças típicas do terceiro mundo, como a malária, a cólera e o sarampo. Não obstante isso tudo, o parco orçamento destinado à saúde pública seria realocado para cuidar de pessoas que tomaram uma infeliz decisão pessoal, em detrimento das verdadeiras vítimas da miséria de nosso país (como aqueles desprovidos de saneamento básico). O terceiro ponto pode ser encarado como o reflexo econômico do fato social descrito no primeiro: um aumento na demanda fatalmente produzirá um aumento na oferta e nossa polícia, nossas forças armadas e - com maior razão - nosso sistema judiciário, que já não possuem condições materiais para dar combate ao tráfico internacional, sofrerão maiores dificuldades do que no presente momento. Diante desse ponto, ainda no campo econômico, cabe uma pergunta: quem produz, comercializa e lucra com o tráfico de drogas e armas em nosso país? Resposta óbvia: as FARCS colombianas, que terão suas receitas e seus arsenais fartamente alimentados caso se vejam diante da oportunidade de expandir seu honrado comércio. Sendo assim, o argumento de que a legalização do consumo diminuiria a violência cai estrondosamente por terra, pois esta aumentaria tanto no âmbito urbano quanto no âmbito internacional. Para encerrar esse longo post, levanto uma reflexão que gostaria de desenvolver melhor em outra ocasião: a descriminalização do uso de drogas vai na mesma direção de uma tendência clara de nosso atual universo jurídico que busca expandir o rol de direitos e garantias sem a necessária contrapartida de responsabilidades individuais (entenda-se: garantias mais nominais que efetivas). Esse fato é de uma clareza meridiana no direito penal, campo em que os doutrinadores buscam abrir cada vez mais portas para a impunidade apontando para o caráter inegavelmente precário de nosso sistema carcerário, cometendo, assim, aquela falácia argumentativa à qual os lógicos denominam "erro categorial", mas que toca em cordas profundas de nossa sensibilidade. Devemos, com isso, ficar atentos, para que essa nociva reforma não seja feita - alheia ao controle democrático - pelas mãos do Supremo Tribunal Federal, órgão sensível aos apelos de nossa "elite pensante", mas não àquilo que o povo nas ruas efetivamente pensa e defende.

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